As
pessoas com infeção crónica para a hepatite C que estão sob tratamento com
metadona ou buprenorfina para gerir uma dependência opiácea podem ser tratadas
de forma segura e eficaz com o 3D, da AbbVie, um regime terapêutico oral de
ação direta com ribavirina, com uma taxa de cura de 97%, de acordo com
relatórios apresentados na 20ª
Conferência Internacional sobre SIDA, em Melbourne.
O vírus
da hepatite C (VHC) é transmitido de forma rápida através da partilha de
seringas ou outro material de consumo de drogas por via injetada e as pessoas
que consomem drogas por esta via têm elevadas taxas de infeção em todo o mundo.
Contudo, normalmente só uma pequena parte desta população recebe tratamento
para o VHC devido a receios – quer reais, quer infundados – relacionados com
tolerância, adesão e uma eficácia inferior à desejada.
Os novos
agentes antivirais de ação direta que atacam diferentes etapas do ciclo de vida
do VHC trouxeram uma revolução no tratamento da hepatite C. Estudos recentes demonstraram
que a combinação de dois ou mais AAD sem interferão pode resultar em taxas de
cura que rondam os 90% na maior parte das populações.
O regime
do 3D da AbbVie consiste no ABT-450, um inibidor da protéase do VHC, numa dose
de 100 mg de ritonavir potenciado e no ombitasvir, um inibidor NS5S (anteriormente conhecido como
ABT-267) numa co-formulação de dose fixa diária, tomada em conjunto com o
dasabuvir (ABT-333), um inibidor da polimerase do VHC de dose dupla diária e
ribavirina. Tal como reportado anteriormente, esta combinação curou 96% de
pacientes que nunca tinham feito o tratamento e de pessoas experientes para o tratamento com o genótipo 1.
Daniel
Cohen, da AbbVie, apresentou as conclusões de um estudo de fase 2 que avaliava
a segurança e eficácia da combinação 3D em pessoas com infeção crónica para o
VHC de genótipo 1 que estavam sob terapêutica de substituição opiácea estável,
quer com metadona, quer com buprenorfina, com e sem naloxona. Os anteriores
estudos sobre interações medicamentosas concluíram que o medicamento da AbbVie
não tinha qualquer efeito significativo nos farmacocinéticos metadona ou buprenorfina.
A
análise incluiu 38 participantes de oito locais da América do Norte. Dois
terços eram homens, quase todos caucasianos e a idade média era de 48 anos. 68%
tinha VHC de subtipo 1a difícil de tratar, os restantes 1b. Um terço tinha a variante genética IL28B. A
maioria (95%) nunca tinha feito anteriormente o tratamento para a hepatite C.
A maior
parte dos participantes tinha fibrose hepática ausente a leve (estágios F0-F1) mas 16% tinham
fibrose moderada (estágio F2) e 5% fibrose avançada (estágio F3); o estudo não
incluiu pessoas com cirrose (estágio F4). As pessoas com VIH ou coinfeção pela
hepatite B também foram excluídas.
Todos os
participantes no estudo aberto – divididos de forma igual entre aqueles que
tomam metadona e os que tomam buprenorfina – foram tratados com a combinação 3D
mais ribavirina (em dose
calculada de acordo com o peso) ao longo de 12 semanas. Foram
acompanhados ao longo das 24 semanas seguintes após a conclusão da terapia para
determinar uma resposta virológica sustentada ou uma carga viral indetetável
continuada (SVR24). Um RNA
do VHC indetetável às 12 semanas após o tratamento (SVR 12) é considerado cura.
À
exceção de um, todos os doentes tinham um RNA do VHC indetetável no final do
tratamento e mantiveram esta resposta nas 24 semanas seguintes, resultando em
taxas de SVR12 e SVR24 de 97%. Os restantes participantes desistiram do estudo
à segunda semana. Não existiram casos de avanço viral ou relapso pós-tratamento.
O regime
3D mais ribavirina foi, regra geral, seguro e fácil de tolerar. Apenas dois
participantes (5.3%) tiveram reações adversas graves (enfarte e cancro),
incluindo os doentes acima mencionados que descontinuaram o tratamento mais
cedo por este motivo. O efeito secundário mais comum é náusea (50%), fadiga
(47%), enxaqueca (32%), insónia (18%) e rash
(16%). Duas pessoas tinham níveis baixos de hemoglobina – um conhecido efeito
da ribavirina – mas nenhum desenvolveu anemia grave.
Não foi
necessário que nenhum participante ajustasse a dose de metadona ou buprenorfina
durante o tratamento para a hepatite C.
“O
regime 3D + ribavirina atingiu uma taxa de SVR24 de 97.4% entre estes 38
pacientes infetados com o genótipo 1 e sob terapêutica de substituição
opiácea”, concluíram os investigadores. Estas conclusões eram “comparáveis a
resultados reportados anteriormente em pacientes com genótipo 1, quer naïve para o tratamento, quer
experientes para o mesmo”.
“Um
regime oral de 12 semanas, altamente eficaz e bem tolerado pode ser uma opção
de tratamento atrativa para pacientes infetados com o genótipo 1 que se
encontrem sob terapêutica de substituição opiácea”, sugeriram, afirmando que
“os pacientes sob terapêutica de substituição opiácea estável podem ser
indicados para o tratamento para o VHC exclusivamente oral”.
Cohen
afirmou que os estudos anteriores comprovaram que o regime 3D é altamente eficaz em pessoas com cirrose mas as interações com metadona
ou buprenorfina “podem ser imprevisíveis em pessoas com doença hepática em
estado avançado”.
Notou
também que os participantes demonstraram uma “adesão muito boa”, de acordo com
as contagens de medicamentos, indicando que as preocupações sobre a
possibilidade de as pessoas que usam drogas não conseguirem manter-se sob
terapêutica não são um motivo para impedir o tratamento com novos e eficazes
regimes livres de interferão.